Reforço tecidual do manguito rotador com enxertos: alternativas e evidências atuais

Introdução

O manguito rotador é um grupo de músculos e tendões que ajuda a movimentar e estabilizar o ombro. Quando esses tendões sofrem lesões grandes, chamadas de lesões extensas, o reparo pode ser mais difícil, e a chance de falha na cicatrização é maior. A evolução biomecânica da cirurgia do manguito rotador foi muito grande na última década, incluindo o desenvolvimento de técnicas de fileira dupla.

Agora estamos na fase inicial da evolução biológica para o maior sucesso da cirurgia do manguito rotador. A evolução biológica tem algumas linhas, com o uso injeções de fatores de crescimento (PRP, células de aspirado de medula óssea ou de gordura) e com o uso de um reforço tecidual durante a cirurgia de reparo do manguito rotador.

Para ajudar a melhorar os resultados dessas cirurgias, surgiram técnicas de aumento tecidual que utilizam enxertos de tecidos para fortalecer o reparo e melhorar a cicatrização.

Outros nomes usados para essa técnica:

  • Aumento tecidual do tendão
  • Enxerto do tendão
  • Patches
  • Rotator cuff augmentation
  • Cuffmend

Ilustração demonstrando a inserção de um enxerto para reforço da sutura do manguito rotador

O que é o Reforço Tecidual?

O reforço tecidual consiste no uso de enxertos biológicos (de tecidos do próprio paciente ou de doadores) para reforçar o local da lesão durante a cirurgia de reparo do manguito rotador. Esses enxertos funcionam como um suporte extra, tanto para ajudar na cicatrização quanto para fornecer mais força e estabilidade ao ombro.

Indicações para o Reforço Tecidual do Manguito Rotador

As técnicas de reforço tecidual do manguito rotador com enxertos tecidual são indicadas para pacientes que têm lesões do manguito rotador e apresentam um risco maior de falha de cicatrização. Para a realização da técnica é necessário que o manguito rotador seja passível de reparo. Para as lesões irreparáveis, utilizamos outras técnicas possíveis. Leia mais nesse link.

Um dos métodos usados para identificar esses pacientes é o Índice de Cicatrização do Manguito Rotador (ROHI), que avalia fatores como:

  • O tamanho e extensão da lesão no tendão
  • A qualidade do tecido que ainda está saudável
  • Se há atrofia muscular ou infiltração de gordura no músculo
  • A idade e saúde geral do paciente

Pacientes com um índice ROHI mais alto têm maior chance de falha e podem se beneficiar do reforço tecidual. Existem diversos outros fatores que não são contemplados por esse índice, que ainda precisa de mais estudos para se consolidar como a melhor alternativa de avaliação do risco de lesão.

O ROHI pode ser calculado nesse link.

Como é realizado o reforço tecidual do manguito rotador?

Existem várias opções para realizar o reforço tecidual no reparo do manguito rotador. O enxerto é suturado acima da sutura do manguito rotador, após o reparo do mesmo e pode ser realizado por artroscopia. Leia mais sobre a cirurgia do manguito rotador nesse link.

O enxerto vai funcionar como um "curativo" biológico do reparo do manguito rotador. Existem diversos enxertos possíveis. Vale reforçar que essa técnica ainda está em uma fase inicial de aplicação e estudos de longo prazo são necessários para comprovar sua eficácia e custo-efetividade.

Ilustração demonstrando uma variação da técnica para lesões menores do manguito rotador

Tipos de enxerto

Enxerto de Fáscia Lata Autólogo

  • O que é?: Usa-se um pedaço da fáscia lata (um tecido forte da coxa) do próprio paciente.
  • Vantagens: Por ser do próprio paciente, não há risco de rejeição.
  • Desvantagens: O paciente precisa passar por outro procedimento para remover o tecido da coxa, o que pode causar dor no local doador.

Enxertos de Banco (de Doadores)

  • O que é?: Utiliza-se tecido de doadores, obtido de bancos de tecidos.
  • Vantagens: Evita a necessidade de retirar tecido do próprio paciente.
  • Desvantagens: Menor potencial de cicatrização. Pequeno risco de rejeição, embora seja baixo. Não é necessário o uso de imunossupressores.

Tendão do Bíceps (Técnica "Biceps Smash")

  • O que é?: Utiliza-se o tendão do bíceps do próprio paciente para reforçar o reparo do manguito rotador.
  • Vantagens: É feito durante a mesma cirurgia e não necessita de outro local doador.
  • Desvantagens: Nem todos os pacientes são candidatos, especialmente se o tendão do bíceps também estiver lesionado.

Enxerto Sintético

  • O que é?: Tecido artificial usados para reforçar estruturas lesadas, como o manguito rotador. Existem alguns novos modelos de enxertos sintéticos bioabsorvíveis
  • Vantagens: Alta resistência, práticos de aplicar e disponíveis em diferentes tamanhos.
  • Desvantagens: Risco de reação de corpo estranho e falta de integração biológica nos casos de sintéticos inabsorvíveis, além de custo mais elevado.

Matriz de colágeno

  • O que é?: Um tipo de enxerto feito de pele humana ou mucosa de intestino de animal, que passa por um processo para remover células, deixando apenas uma estrutura tecidual.
  • Vantagens: A estrutura imita o tecido humano e pode promover uma boa integração.
  • Desvantagens: Não estão disponível no Brasil e tem um custo elevado.

Resultados Esperados

Embora as técnicas de reforço tecidual sejam promissoras, os resultados ainda estão sendo estudados. Essas técnicas podem aumentar as chances de sucesso do reparo do manguito rotador, especialmente em pacientes com lesões mais graves ou mais fatores de risco de falha de cicatrização, mas ainda faltam estudos robustos e de longo prazo para comprovar a real eficácia. Existem poucos estudos comparando a técnica com e sem o enxerto, com resultados inicial promissores.

Pacientes que passam por reforço tecidual geralmente têm uma melhora na função e na dor, mas é importante lembrar que a cicatrização completa do manguito rotador pode levar vários meses.

Recuperação Pós-operatória

A recuperação após a cirurgia com reforço tecidual segue um processo semelhante ao reparo tradicional do manguito rotador. O paciente geralmente precisa usar uma tipoia por 4 a 6 semanas e seguir um programa de fisioterapia para restaurar a mobilidade e a força do ombro. A reabilitação é essencial para garantir o sucesso da cirurgia e pode levar de 6 a 12 meses.

Alternativas ao Reforço Tecidual

Para pacientes que não são bons candidatos ao reforço tecidual, existem outras opções de tratamento, como:

  • Reparo parcial do manguito rotador: Técnica mais tradicional para pacientes com lesões irreparáveis.
  • Reconstrução da cápsula superior: Alternativa para pacientes com lesões irreparáveis do supraespinal.
  • Reconstrução do cabo dos rotadores: nova técnica para lesões irreparáveis, ainda em fase de estudos.
  • Cirurgia de transferência tendínea: Utiliza outros tendões para substituir as funções dos tendões lesionados.
  • Artroplastia reversa de ombro: Para casos mais graves ou com artrose associada. Leia mais nesse link

Riscos e Complicações

Assim como em qualquer cirurgia, o reforço tecidual apresenta alguns riscos, incluindo:

  • Infecção no local da cirurgia.
  • Reação ao enxerto, principalmente em casos de enxertos de doadores.
  • Persistência da dor ou limitação de movimento.

As complicações neurológicas também podem ocorrer, embora sejam raras. Em geral, a taxa de complicações em cirurgias de reforço tecidual é baixa, girando em torno de 5-10%.

Referências


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Mauro Gracitelli
Médico especialista em ombro e cotovelo
www.maurogracitelli.com
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